sexta-feira, 31 de outubro de 2008

EDIÇÃO DE HOJE/AMANHÃ DO JORNAL FONTE NOVA


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JÚLIO

JÚLIO

Nasce em Vila do Conde em 1 de Novembro de 1902. Em 1919, inicia os estudos de Engenharia Civil, no Porto, matriculando-se simultaneamente como aluno voluntário na Escola Superior de Belas-Artes, a qual frequentou durante dois anos.


Colaborou na revista Presença, desde 1927, até à sua extinção em 1940. Será o grande impulsionador da estética presenciana nas artes plásticas portuguesas, chegando a ser cognominado o seu “pintor oficioso” por João Gaspar Simões. O espírito desta publicação, manifestado nas obras de Júlio, caracterizava-se pela defesa de uma expressividade lírica e imediata em que a arte e a vida se entrelaçavam. Era valorizada a liberdade absoluta, refutando qualquer espécie de academismo.

Apesar de começar a pintar em 1923, só em 1930 participa numa exposição, o Salão dos Independentes, e a primeira individual acontece em 1934 na Sociedade Nacional de Belas-Artes. Estes anos marcam a primeira fase e, provavelmente, a mais conhecida do seu percurso.

No ano seguinte, por exigências da sua vida profissional, abandona a pintura. O desenho, expressão que já tinha vindo a ganhar relevância na sua produção, passa a ser o seu principal trabalho. Esta deslocação de suporte acompanha uma ruptura radical na sua estética e estabelece a divisão entre dois percursos diversos, quase antagónicos, fundidos numa só trajectória. Voltará à pintura em 1972, desta vez em harmonia com o discurso estético que vinha a praticar.

Nos óleos, Júlio constrói um universo expressionista, conjugando a tendência dramática e violenta de Grosz com o realismo mágico de Chagall. A realidade aparece como ponto de partida para um submundo onde as fronteiras e as regras espaciotemporais são substituídas pela visão poética-onírica do pintor, oscilante entre o grotesco e o maravilhoso.

O pano de fundo destas obras é a cidade, não numa abordagem topográfica, mas como espelho do clima psicológico da cena. Júlio apresenta concomitantemente o obsceno e o lírico, o cómico e o trágico do quotidiano urbano, numa visão fortemente caricatural. Formalmente, estas obras manifestam, por vezes, momentos de profunda violência, em que a linha negra, com crueza expressionista, apresenta uma sociedade teatral e corrupta, povoada por bêbedos, burgueses repugnantes e prostitutas entediadas. A estes momentos contrapõem-se os de simplicidade, inocência e pureza, marcados por um aclaramento dos contrastes e pelo suavizar da linha. É o caso de Tarde de Festa, na qual encontramos uma mulher sorridente que olha para a janela e sonha, transformando os elementos que a rodeiam em flutuantes metáforas poéticas.

É de salientar a originalidade na utilização da paleta de cor, dominada por vermelhos, laranjas e amarelos puros e estridentes.

No início da década de 30, irá experimentar diferentes tendências, com uma série de desenhos surrealistas e pinturas abstractas, antecedendo em mais de uma década o aparecimento dessas estéticas em Portugal. O desenho de Júlio é marcado pelo Expressionismo até 1935; depois desta data o artista opta por um lirismo bucólico, quase pastoral, dividido em grandes séries – O Poeta, Nocturnos, A Família, O Circo – nas quais trabalha durante anos consecutivos. Não se debruça sobre muitos motivos, optando por aprofundar os poucos que elegeu, numa insaciável busca da perfeição.

O traço a tinta-da-china começa por ser rígido, para evoluir rumo à depuração e desmaterializando os contornos. O minimalismo do traço e da cor, reduzida maioritariamente ao preto e branco, leva Júlio, mais uma vez, a percorrer caminhos pouco trilhados na arte portuguesa.

A linha é suave, a cor, quando existe, depurada, clara. É um universo contaminado pela ingenuidade, numa tentativa nostálgica de reencontro do homem com a natureza.

De particular importância é a série do Poeta, a mais numerosa, na qual, atrás de uma aparente simplicidade, o pintor apresenta uma série de auto-retratos que reflectem uma visão lírica e de auto-análise existencial.

Júlio foi também poeta, assinando sob o pseudónimo de Saul Dias. Publica seis livros, muitos dos quais impulsionados pelo seu irmão, José Régio. Estas duas pessoas Júlio e Saul, estas duas expressões artísticas, não podiam deixar de se contaminar. Assim, tanto na pintura como nos versos, o autor apresenta-nos a arte como visão poética da vida, plena de contrastantes hostilidades e magias, realidades e sonhos.

F.O.

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JÁ FOSTE RICO E FORTE E SOBERANO

Já foste rico e forte e soberano,
Já deste leis a mundos e nações,
Heróico Portugal, que o gram Camões
Cantou, como o não pôde um ser humano!

Zombando do furor do mar insano,
Os teus nautas, em fracos galeões,
Descobriram longínquas regiões,
Perdidas na amplidão do vasto oceano.

Hoje vejo-te triste e abatido,
E quem sabe se choras, ou então,
Relembras com saudade o tempo ido?

Mas a queda fatal não temas, não.
Porque o teu povo, outrora tão temido,
Ainda tem ardor no coração.


Saúl Dias,
Dispersos (Primeiros Poemas)

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quinta-feira, 30 de outubro de 2008

PORTALEGRE - LANÇAMENTO DO Nº 4 DA REVISTA PLÁTANO


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A Revista de Arte e Critica de Portalegre PLÁTANO apresenta o seu nº 4 no próximo dia 1 de Novembro, pelas 16 horas na sala polivalente da Biblioteca Municipal de Portalegre.
A apresentação da Revista de Arte e Critica de Portalegre PLÁTANO estará a cargo de Carlos Rôlo, segue-se uma conferência sobre Formas de Cultura de Portalegre, em que vão ser oradores Avelino Bento, Fernando Pina e Garcia de Castro.
Termina a sessão de apresentação da Revista de Arte e Critica de Portalegre PLÁTANO com um concerto, em que será interpretada a peça:
1978 - Sonata de Outono, pelos músicos Oleksandra Stepanska e Lyudmyla Gladysheva .

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POEMA PARA GALILEO


Estou olhando o teu retrato, meu velho pisano,

aquele teu retrato que toda a gente conhece,

em que a tua bela cabeça desabrocha e floresce

sobre um modesto cabeção de pano.

Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da tua velha Florença.

(Não, não, Galileo! Eu não disse Santo Ofício.

Disse Galeria dos Ofícios.)

Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da requintada Florença.



Lembras-te? A Ponte Vecchio, a Loggia, a Piazza della Signoria…

Eu sei… eu sei…

As margens doces do Arno às horas pardas da melancolia.

Ai que saudade, Galileo Galilei!



Olha. Sabes? Lá em Florença

está guardado um dedo da tua mão direita num relicário.

Palavra de honra que está!

As voltas que o mundo dá!

Se calhar até há gente que pensa

que entraste no calendário.



Eu queria agradecer-te, Galileo,

a inteligência das coisas que me deste.

Eu,

e quantos milhões de homens como eu

a quem tu esclareceste,

ia jurar- que disparate, Galileo!

- e jurava a pés juntos e apostava a cabeça

sem a menor hesitação-

que os corpos caem tanto mais depressa

quanto mais pesados são.



Pois não é evidente, Galileo?

Quem acredita que um penedo caia

com a mesma rapidez que um botão de camisa ou que um seixo da praia?

Esta era a inteligência que Deus nos deu.



Estava agora a lembrar-me, Galileo,

daquela cena em que tu estavas sentado num escabelo

e tinhas à tua frente

um friso de homens doutos, hirtos, de toga e de capelo

a olharem-te severamente.

Estavam todos a ralhar contigo,

que parecia impossível que um homem da tua idade

e da tua condição,

se tivesse tornado num perigo

para a Humanidade

e para a Civilização.

Tu, embaraçado e comprometido, em silêncio mordiscavas os lábios,

e percorrias, cheio de piedade,

os rostos impenetráveis daquela fila de sábios.



Teus olhos habituados à observação dos satélites e das estrelas,

desceram lá das suas alturas

e poisaram, como aves aturdidas- parece-me que estou a vê-las -,

nas faces grávidas daquelas reverendíssimas criaturas.

E tu foste dizendo a tudo que sim, que sim senhor, que era tudo tal qual

conforme suas eminências desejavam,

e dirias que o Sol era quadrado e a Lua pentagonal

e que os astros bailavam e entoavam

à meia-noite louvores à harmonia universal.

E juraste que nunca mais repetirias

nem a ti mesmo, na própria intimidade do teu pensamento, livre e calma,

aquelas abomináveis heresias

que ensinavas e descrevias

para eterna perdição da tua alma.

Ai Galileo!

Mal sabem os teus doutos juízes, grandes senhores deste pequeno mundo

que assim mesmo, empertigados nos seus cadeirões de braços,

andavam a correr e a rolar pelos espaços

à razão de trinta quilómetros por segundo.

Tu é que sabias, Galileo Galilei.



Por isso eram teus olhos misericordiosos,

por isso era teu coração cheio de piedade,

piedade pelos homens que não precisam de sofrer, homens ditosos

a quem Deus dispensou de buscar a verdade.

Por isso estoicamente, mansamente,

resististe a todas as torturas,

a todas as angústias, a todos os contratempos,

enquanto eles, do alto incessível das suas alturas,

foram caindo,

caindo,

caindo,

caindo,

caindo sempre,

e sempre,

ininterruptamente,

na razão directa do quadrado dos tempos.


António Gedeão

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quarta-feira, 29 de outubro de 2008

NEGLIGÊNCIA NO PARTO

Portalegre: Criança morre 35 dias depois de nascer com lesões irreversíveis

Um médico espanhol, prestador de serviços no Hospital Doutor José Maria Grande, Portalegre, foi suspenso depois de acusações de negligência grosseira por parte dos pais de uma bebé que nasceu, após horas de trabalho de parto complicadas, com lesões irreversíveis, que lhe viriam a provocar a morte 35 dias mais tarde.
Os pais da criança não se conformam e pedem justiça.


'Foi um bocado de nós que foi arrancado. Não temos a menor dúvida de que foi a actuação do médico que provocou a morte da nossa filha Nicole', disse ao CM Joaquim Pinheiro, pai da recém-nascida que veio a falecer em resultado de uma encefalopatia hipóxica de grau 3, provocada pela asfixia durante as dez horas de trabalho de parto. Durante cerca de metade desse tempo, a criança terá sufocado várias vezes, chegando mesmo a ter paragens cardíacas.

'Ele nunca quis avançar para a cesariana. Não percebemos porquê, se havia complicações. Depois forçou a dilatação e arrancou a minha filha com fórceps e ventosas', relata Maria Aparecida, mãe de Nicole.

A menina ainda resistiu durante 34 dias, antes de falecer a 14 de Outubro. Depois das complicações iniciais, foi transferida para o Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa, onde foi descoberto que, além das lesões cerebrais, a criança estava tetraplégica. O casal, que reside em Portalegre, não se conforma e deu início a uma campanha que reclama 'justiça para a Nicole e o apuramento de responsabilidades'.

Contactado pelo CM, o Hospital de Portalegre diz que o clínico foi de imediato suspenso 'devido a uma suspeita de negligência', à qual se junta agora um processo de averiguações e uma perícia médica que ainda decorre. O episódio trágico foi comunicado também ao Ministério Público e ao Ministério da Saúde, bem como à Inspecção-Geral de Saúde. O clínico espanhol sobre quem recaem as suspeitas, Luis Garcia Paradells, está incontactável.

APONTAMENTOS

YOUTUBE

Os pais da bebé colocaram no site de internet YouTube vídeos da criança feitos enquanto recebia tratamento hospitalar, onde são visíveis as debilitações físicas da bebé.

MÉDICO

O médico espanhol Luis Garcia Paradells não está no quadro clínico do Hospital de Portalegre, exercendo na unidade apenas em prestação de serviços. Antes havia também exercido na Maternidade de Elvas.

LUTO

A família diz que só quando forem apuradas as responsabilidades poderão fazer o luto da situação 'devastante'. O quarto que seria para Nicole permanece inalterado.

RECLAMAÇÃO

Na carta enviada ao Hospital de Portalegre, Joaquim Pinheiro queixa-se ainda de que a assistência pós--parto na unidade não foi a mais correcta.


Pedro Galego

Correio da Manhã

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EDIÇÃO DE HOJE DO ALTO ALENTEJO


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EM BUSCA

Ponho os olhos em mim, como se olhasse um estranho,
E choro de me ver tão outro, tão mudado…
Sem desvendar a causa, o íntimo cuidado
Que sofro do meu mal — o mal de que provenho.

Já não sou aquele Eu do tempo que é passado,
Pastor das ilusões perdi o meu rebanho,
Não sei do meu amor, saúde não na tenho,
E a vida sem saúde é um sofrer dobrado.

A minh’alma rasgou-ma o trágico Desgosto
Nas silvas do abandono, à hora do sol-posto,
Quando o azul começa a diluir-se em astros…

E à beira do caminho, até lá muito longe,
Como um mendigo só, como um sombrio monge,
Anda o meu coração em busca dos seus rastros…


José Duro

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terça-feira, 28 de outubro de 2008

PORTALEGE - SAÚDE - MAIS UMA DE MUITAS...

Obstetra acusado de negligência afastado do Hospital de Portalegre

O Hospital de Portalegre "afastou" das suas funções um obstetra, depois deste ser acusado de negligência médica pelos pais de uma bebé falecida este mês, 34 dias após o parto, disse esta terça-feira o porta-voz da unidade de saúde.

Ilídio Pinto Cardoso, porta-voz do hospital, adiantou à agência Lusa que o caso já foi comunicado ao Ministério Público e à Ordem dos Médicos.

De acordo com a mesma fonte, está também a decorrer "uma peritagem médica sobre a gravidade dos actos médicos praticados".

Em causa, está a queixa dos pais de uma bebé, a que a agência Lusa teve acesso, que acusam um obstetra espanhol de negligência médica.

"Nós queremos que o médico seja responsabilizado pelo homicídio que cometeu", disse hoje à Lusa o pai da bebé, Joaquim Pinheiro.

De acordo com o relato do pai, o médico terá "adiado" a decisão de realizar uma cesariana à grávida, tendo a bebé "asfixiado".

O caso remonta ao dia 09 de Setembro deste ano, quando a grávida deu entrada no hospital.

"Após dez horas de trabalho de parto, em que se aguardava por uma dilatação, a bebé terá feito várias paragens cardíacas e asfixiado", lembrou.

"O médico recusou sempre a cesariana, insistiu sempre no parto normal e, inclusive, maltratou a minha companheira", salientou Joaquim Pinheiro.

Depois de várias horas, o parto ocorreu na madrugada do dia seguinte, com recurso a ventosas e a fórceps, "sem a dilatação mínima para o efeito e contra a vontade da restante equipa médica", recordou.

Antes de ser transferida para o Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa, a bebé terá sido reanimada, sobrevivendo com o recurso à ventilação artificial.

De acordo com Joaquim Pinheiro, a carência de oxigénio e de líquidos terá provocado na criança uma "encefalopatia hipóxica isquémica".

Já em Lisboa, disse, os clínicos detectaram ainda que a bebé sofrera "uma lesão medular alta, ficando tetraplégica", tendo falecido no dia 14 deste mês.

Contactado pela Lusa, o porta-voz do hospital garantiu que "o médico, que exercia nesta unidade hospitalar, em regime de prestação de serviços, foi afastado e o caso foi comunicado ao Ministério Público e à Ordem dos Médicos.

"Está também a decorrer uma peritagem médica sobre a gravidade dos actos médicos praticados", disse I.P.C.


Lusa

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22ª BAJA PORTALEGRE 500/2008

Programa e mapa de percurso




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VIA NOVA

Segundo o general de Gaulle, comete-se por vezes o erro de ter razão antes de tempo. Na moção "Falar é preciso", apresentada ao Congresso do PS em 1999, cometi esse erro:

"A crise financeira que alastrou, dos mercados asiáticos à Rússia e já ameaça gravemente o Brasil e toda a América Latina, pode minar, de um momento para o outro, pela incerteza e pela volatilidade, o próprio funcionamento dos maiores centros financeiros do mundo. A 'mão invisível' falhou. São os mais ortodoxos ultraliberais, como Milton Friedman, quem vêm agora pedir a nacionalização da banca no Japão.

"E é por isso que é necessária uma nova esquerda. À escala europeia, primeiro. Mas capaz de se fazer ouvir, também, à escala mundial. À dimensão planetária do actual poder económico, financeiro e mediático, há que contrapor uma alternativa política.

"Temos de continuar a exigir uma reforma das instituições internacionais, do FMI ao Banco Mundial, para que deixem de ser arautos e agentes do pensamento único. Outra lógica terá de presidir à Organização Mundial do Comércio, para que a livre circulação de mercadorias não se torne em mais um instrumento de enfraquecimento das economias mais frágeis.

"É preciso regular os mercados financeiros mundiais, cuja ditadura e irracionalidade põem em causa a própria estabilidade dos sistemas políticos democráticos."

Que fazer agora?

Os defensores do Estado mínimo, ideologicamente derrotados, pedem a intervenção do Estado. Para quê? Suspeita-se que para manter o que está e socializar as perdas. O problema é que, se tudo ficar na mesma, as mesmas causas produzirão os mesmos efeitos.

E a esquerda? Como escrevi, também antes de tempo, na moção que levei ao Congresso do PS de 2004:

"A esquerda tem de integrar e debater, no seu pensamento próprio, os princípios e os instrumentos possíveis de regulação da globalização: o combate à predação das multinacionais que localizam e deslocalizam investimentos a seu bel-prazer, a taxação das transacções financeiras internacionais, a abertura dos mercados dos países desenvolvidos às exportações oriundas dos países em vias de desenvolvimento, a travagem da proliferação dos off-shores, o combate à economia 'suja' dos tráficos de pessoas, drogas e dinheiro, o combate à exploração de mão-de-obra infantil, escrava ou sem quaisquer direitos sociais, e à degradação ambiental."

Propus então um novo Contrato Social. E um Estado estratega, "cuja função não se reduz ao papel de árbitro, mas de produtor de bens públicos essenciais, desde o funcionamento do Estado de Direito à promoção dos serviços de interesse geral e à regulação dos mercados. Um Estado estratega a quem caberá suprir as falhas do mercado e estimular áreas ou sectores qualificados." E acrescentava: "Para desempenhar essa função, o Estado precisa de manter nas suas mãos instrumentos eficazes, como por exemplo a Caixa Geral de Depósitos."

Hoje até Alan Greenspan reconheceu que errou ao confiar que o mercado pode regular-se a si próprio. Mas, em 2004, aquelas ideias que propus pareceram arcaicas aos fundamentalistas do neoliberalismo e aos entusiastas da chamada esquerda moderna.

Não se sabe que réplicas se seguirão ao tsunami que abalou o sistema financeiro mundial. Nem até que ponto irá a recessão económica e quais as suas consequências sociais e políticas. Sabe-se que nada ficará como dantes. Mas em que sentido se fará a mudança? Era aí que a esquerda deveria ter um papel. Mas onde está ela? Talvez algo de novo possa surgir de uma vitória de Obama. Pelo menos um sopro de renovação. Mas há um grande défice de esquerda na Europa. Uma nova esquerda só poderá nascer de várias rupturas das diferentes esquerdas consigo mesmas. Ruptura com as práticas gestionárias e cúmplices do pensamento único. Ruptura com a cultura do poder pelo poder e com o seu contrário, a cultura da margem pela margem, da contra-sociedade e do contrapoder. Processo difícil, complicado, mas sem o qual não será possível construir novas convergências. Não para a mirífica repetição da revolução russa de 1917, nem para um modelo utópico global. Tão-pouco para segundas ou terceiras vias. Mas para uma via nova, que restitua à esquerda a sua função de força transformadora da sociedade e criadora de soluções políticas alternativas.


Manuel Alegre
Diário de Notícias

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TEMPO DE NATAL EM BARRANCOS

-É esse o nosso ofício - aproveitei para explicar. -Desta vez ando à procura de uns fósseis que provam que aqui foi mar há uns quatrocentos milhões de anos.

-Diga-me cá, -salientou o professor. -E como é que aqui foi mar e hoje é tudo terra em seco?

-Bom, isso tem a sua explicação, mas leva tempo.

-Foi o Dilúvio, -meteu-se na conversa o Padre Agostinho, até aí calado, mas particularmente atento.

-Bem, retorqui-lhe -escolhendo as palavras. -Essa é uma história que nos põe num outro campo que nada tem a ver com o nosso trabalho. Uma história que dava pano para mangas... -rematei, sorrindo-lhe.

-Venha para cá no Verão, por altura das festas, -atalhou o eclesiástico -vai ver que gosta. Depois fica aí uns dias connosco para falarmos destas coisas. Tertúlia já nós temos. O Zé Adrião diz que tem lá no monte um peixe petrificado, metido no xisto. O Mário já foi ver e diz que parece mesmo um peixe, assim, grande -e abriu os braços, ao jeito dos pescadores desportivos quando falam das suas proezas. -Temos de ir vê-lo.

Só ao terceiro dia localizei a tão desejada camada com fósseis. Após duas jornadas de insucesso, ocorreu-me pedir ajuda a um pastor com quem já me havia cruzado. Depois de umas palavras de circunstância e de umas festas ao cão, que logo me reconheceu e se aproximou a abanar vigorosamente a cauda, tirei do saco a dita amostra de ftanito bem embrulhada em jornal.

-Vossemecê já viu por aqui pedra como esta, com estes risquinhos? - perguntei, passando-lhe para a mão o exemplàr que trouxera de Lisboa.

-Já vi, sim senhor - respondeu, satisfeito, com o ar de quem sabia do que estava a falar. -Uns são direitos, outros enroladinhos. Têm assim um denteado como a folha da serra de rodear.

-É isso mesmo. E onde é que os posso encontrar? -prossegui, animado pela resposta.

-Há aí vários sítios com esta pedra -disse, olhando-a atentamente. -É muito diferente do resto. É mais dura e não abre nem deixa meter a folha da navalha, como o xisto. Umas são mais claras e outras mais escuras, como esta. Que eu me lembre, assim de repente, aparece ali para o Calvário. Também as há nas Boticas, em Noudar e ao pé da capela de São Ginés -nomes que foi pronunciado, pausadamente, à medida que os ia tirando da memória dos muitos sítios daquele que era o seu mundo. -Mas há mais. Olhe, ali atrás daquele cerro. Está a ver? -e apontou com o cajado. -Na Cerca das Almas, também se apanha obra desta. Há um caminho que passa no alto, -continuou -na direcção de quem vai para a vila. Em lá chegando, vê logo um barranco fundo à sua mão direita. É aí, na ladeira, que há pedra igual a esta, cheínha destas coisas.

Abri o mapa e orientei-o. Lá estava a Cerca das Almas, a uns três quilómetros dali. Marquei o local que me pareceu corresponder à descrição do pastor, dei-lhe os bons dias, fiz mais umas festas ao rafeiro e pus-me a caminho. Era meio dia quando cheguei ao ponto assinalado, dominado por enorme expectativa e pelo receio de mais uma tentativa falhada. Mas não. A camada fossilífera estava finalmente ali, à minha frente. A cada golpe de martelo a rocha abria-se-me nas mãos, repleta dos tão procurados Monograptus. Sentei-me a comer o farnel que sempre levava por almoço e passei o resto da tarde a partir ftanito e a enrolar em jornais todos os fragmentos que contivessem os ditos fósseis, posto o que regressei à vila, ajoujado ao peso da preciosa carga. No fim dessa tarde foi a festa. Festejava-se a despedida, mas também o achado pelo qual já todos ansiavam e que, naturalmente, todos desejavam observar de perto. Desembrulharam-se as amostras e cada um viu o que quis e comentou ou perguntou o que lhe apeteceu.

-Vai já amanhã embora? Na carreira das sete e meia? -perguntou-me por fim um dos presentes que, de seguida, gritou para o empregado, ao fundo da sala -Juzé Manué, bei acá i trázi maih uma jarra di binhú i uma pihca de catalão assadu.

Missão cumprida, podia regressar. E ainda faltavam dois dias para o Ano Bom. Na bagagem trouxe comigo um talego de chita cheio de lembranças dos meus amigos barranquenhos, uma preciosidade que entreguei à minha mãe.

-Isto faz um jeitão -comentou, no seu estilo de experiente e hábil gestora da economia familiar. -Mas que bem que cheiram os enchidos! E este pão, que coisa linda! E estes queijos e estas azeitonas! Louvado seja o Menino! (...)




A.M. Galopim de Carvalho

Extratos de:
Tempo de Natal em Barrancos

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segunda-feira, 27 de outubro de 2008

JESUS CRISTO SUPER-FISCO

A VIÚVA JUNTO AO RIO



Estou sentada na margem do rio e Deus está sentado ao meu lado. Estou sentada sobre as ervas. Estico o braço e toco as águas que se aproximam da margem para falarem comigo.
Mergulho os dedos e a água é fresca. Ouço as palavras serenas que a água me diz. Deus estica o braço e toca o rio inteiro com pontos de luz.
O corpo do rio agita-se lentamente. Todo o seu corpo é de água. O rio é sempre jovem. Podem passar séculos. Pode passar toda a eternidade. O rio é sempre jovem. Há quarenta anos, o rio era exactamente igual. Eu era diferente. Deus não estava sentado ao meu lado. Há quarenta anos era de manhã.”
….
Aproximei-me do rio, da árvore velha e sentei-me. Passaram instantes em que o esperei, em que imaginei que ele pudesse não vir…
...
O rio continuava o êxodo das coisas belas.

Senti uma mão tocar tocar-me no ombro, voltei-me e vi o sol. Perguntou: Posso sentar-me? Sentimos a presença um do outro. O rio sentiu a nossa presença. O meu olhar ia com o rio. Havia uma aragem que trazia a água, que trazia o fresco da água. Senti os seus dedos no meu pescoço, na minha face, nos meus cabelos. Virei-me para ele. O seu rosto aproximou-se. Os seus lábios aproximaram-se lentamente.

A minha mãe entrou na sala. Os seus olhos eram dois incêndios. Agarrou-me o braço com força e disse nunca mais te vais encontrar com aquele rapaz.

Levaram-me para um quarto onde nunca tinha entrado. Era um quarto que ficava do outro lado da casa.
….
Da janela via-se o rio, via-se as margens e, ao longe muito pequena, via-se a árvore velha. Os homens agarraram-me pelo tornozelo e fecharam-me numa algema de ferro, que estava presa a uma corrente, que estava presa à parede, que entrava dentro da parede. Fecharam a porta.

Passaram-se muitos anos. Debaixo da árvore velha ele ia envelhecendo. De manhã, sentava-se ali sozinho e ficava a olhar o rio e eu ficava a olhá-lo. Tão longe. As criadas envelheceram. A minha mãe envelheceu. Eu envelheci.
….
Uma manhã ele não se sentou debaixo da árvore velha. Essa manhã demorou mais tempo do que os anos em que, ao acordar, sabia que iria vê-lo lá longe, com os contornos recortados pelo rio. Fiquei toda a manhã a olhar o seu espaço vazio debaixo da árvore velha.

Ele nunca mais se sentou na margem do rio.

Eu era muito velha. Tinham passado quarenta anos sobre o dia em que o encontrei na margem do rio, tinham passado quarenta anos sobre a minha vida.
….
Hoje estou sentada na margem do rio e Deus está sentado ao meu lado. Há quarenta anos, era de manhã. Há quarenta anos, o rio era exactamente igual. Estou velha. Também Deus está velho. Sentamo-nos juntos e pensamos. O tempo é mais leve. Nem eu, nem Deus esperamos nada.

José Luís Peixoto

Excerto de: A viúva junto ao rio

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sexta-feira, 24 de outubro de 2008

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REGRESSO DE ORFEU






(...) Orlando Neves retoma, portanto, a ponta de um longo fio, com dois milénios de extensão. Regresso de Orfeu é, como indica o subtítulo, um clamor, que alia a voz, o canto, à exaltação. Podemos considerar a existência de três momentos na totalidade da obra. No primeiro, perdido o carácter superior e divino do passado, Orfeu regressa à terra sem triunfo nem reconhecimento público, para que celebre no seu canto a vida dos homens. Ele é o homem depois da queda, um ser do tempo e da transitoridade, com um destino mortal, e não poderá alterar o mundo, apenas esquecer o passado e viver a vida efémera dos homens, praticando o jogo da coexistência dos contrários e dando com o seu canto uma dimensão sublime ao desejo dos homens. O segundo momento é constituído por um longo parágrafo em que Orfeu responde indirectamente à exortação anterior e se define a si mesmo como um ser múltiplo em que os contrários coexistem sem que seja possível alcançar a unidade (a última e mais dramática expressão dessa multiplicidade é o desmembramento do cadáver de Orfeu). Almejando a unidade, o absoluto e o eterno, encontra-se numa situação humana, corrupta, mortal. Ao passado feliz opõe-se a ruína do presente, o nada, a morte no futuro. Ele é um suicida que é obrigado a viver e a cantar, mas que não obedece à exortação que lhe foi feita e se refugia na solidão, procurando libertar-se da multiplicidade das máscaras e encontrar a verdade. Podemos considerar como um terceiro momento a mais extensa parte da obra, composta por poemas em que o antigo poeta-deus assume a tarefa de que foi incumbido e se apresenta como o sujeito da enunciação. Mas, longe de exaltar a humana condição, Orfeu, em textos com uma tonalidade clássica, declamatória e exclamativa, aprofunda a visão deceptiva da vida, já brevemente enunciada. Ele permanece na zona da indefinição, da oscilação dos contrários: entre a luz e a sombra, entre a noite e o dia, entre a vida e a morte, entre o divino e o humano. Consciente dos males do mundo, está fora do seu alcance modificá-lo. Aspira ao absoluto e ao eterno e está condenado ao precário, ao transitório. Orfeu carrega uma culpa (ter perdido Eurídice), mas não pode sequer viver da memória da felicidade passada, obrigado a, solitário, ser do mundo.

O canto de Orfeu não é agora suave e apaziguador como no passado, mas um canto triste e mortal sobre o declínio, o vazio, o nada. O espaço em que se reconhece é a noite (o apelo à luz tem a marca da brevidade), o esquecimento (embora irrompa, por vezes, a memória da felicidade, o nome fugaz de Eurídice), a solidão, a proximidade da morte que fechará o círculo: «E de novo surgirei, qual ave do sol,/ para ser cinza, eclipse e fatalidade» (p. 63). O itinerário de Orfeu traçado nestes textos implica, além de uma visão profundamente deceptiva da existência, sem amor, sem Eurídice, perdida a própria identidade («Contemplai o homem que o nome perdeu», p. 24), uma problemática da criação poética. Orfeu volta à terra para cantar o destino dos homens, tarefa que inverte. Mas a acção de cantar, o clamor, existe, provam-no os próprios textos que, no entanto, anunciam o vazio e a morte, são eles próprios suicidas, porque se colocam à beira do vazio das palavras, do silêncio total. Orfeu diz que criou, mas já não cria. A criação está ligada à memória (do amor: «Porque é da recordação que falo e a sinto/ porque com ela crio e reflicto...», p. 61) que lhe está interdita, e, vazia a vida, vazio se torna o canto, apenas um eco («Cada dia a vida, agora tácita, repete,/ na áspera lira, o rumor de dentro, onde, Orfeu / de nunca e autor da morte,/ tão-só me ecoo», p. 62).

É interessante como um conjunto de textos que a si próprio se define como um clamor anuncia a morte das palavras e do poeta: «Também em mim vão adoecendo as palavras / e fará branco o meu retorno a nada» (p. 48). Esta é mais uma das oposições que estruturam esta obra de densa leitura, carregada de referências clássicas, mas colocando problemas de natureza filosófica e literária bem actuais. Ouçamos o silêncio dentro do clamor: «Em breve há que atingir o vazio / da memória e nela persistir. Até que / livre das máscaras que nos corpos fui / venha, última, a surdez das vozes» (p. 38-9).


Ana Teresa Diogo
Colóquio/Letras

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quinta-feira, 23 de outubro de 2008

SERÁS PÚBLICA PEDRA

Serás pública pedra cacto areia palavra
usando o horizonte o corpo o seio o risco o sexo.


Nem de praia ou brisa ou sol ou ócio ou repto
projectam os passos as fibras as veias as faces.


Há quem com a fera o veneno o punhal a farpa
sepulte a cópula o suor o óleo o lírio a dor.


Viverás na morte peixe sismo cálice pele
balcão de carne sal centeio sangria jejum.


Orlando Neves
Poesia - Obra completa

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quarta-feira, 22 de outubro de 2008

PORTALEGRE - CENTRO DE REALIDADE VIRTUAL



O ICT-VR (International Center for Technology in Virtual Reality) conta com um investimento de 7,5 milhões de euros e a parceria tecnológica da Sun Microsystems.
O projecto pretende ser uma âncora de suporte à criação e deslocalização de empresas que pretendam apostar em tecnologias emergentes.
O ICT-VR está para isso a criar um Instituto de Novas Tecnologias, com o apoio do POR-Alentejo e quer colocar as competências desenvolvidas ao serviço de um cluster nacional de tecnologias de realidade virtual e do desenvolvimento regional.
O Centro está sedeado em Portalegre e conta com diversos laboratórios, um show room vocacionado para testes e demonstrações, espaços para incubar projectos e empresas e uma sala de formação.
Como parceira tecnológica a Sun vai fornecer equipamento e tecnologia para o Centro de Realidade Virtual, nomeadamente 20 workstation Sun Ultra 40 M2, 5 workstation Sun Ultra 20 M e 1 Sun Blade 6000.

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ALENTEJO PROJECTA-SE NA REALIDADE VIRTUAL

Há quem ache que o desenvolvimento no Alentejo seja algo só possível em realidade virtual.

Mas há também quem não pense bem assim e defenda que a realidade virtual é a chave para o desenvolvimento da região.

Esta quarta-feira, foi apresentado em Portalegre o primeiro centro dedicado exclusivamente a este tipo de tecnologia, em Portugal. O objectivo é torná-lo num pólo dinamizador, que contagie o resto do país.

«É um centro que pretende divulgar, desenvolver e transferir tecnologia de realidade virtual, com o objectivo de ajudar a competitividade das empresas, instituições e regiões», disse Gastão Marques, em entrevista ao PortugalDiário (veja o vídeo), durante a apresentação do projecto. O director do ICT-VR (Internacional Center for Technology in Virtual Reality), responsável pelo desenvolvimento deste centro em parceria com a Sun Microsystems, explicou ainda que o centro irá funcionar «como uma âncora que ajude Portugal a ter um cluster [agrupamento de empresas de indústrias do mesmo tipo]», nesta área.

Em embrião desde Setembro de 2006, quando o ICT-VR iniciou na cidade alentejana as primeiras incursões no 3D, o novo projecto está prestes a receber instalações a estrear. Para já, as demonstrações apresentadas esta quarta-feira saíram da sala da Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Portalegre, onde o ICT-VR tem a suas primeiras máquinas.


Complexo pronto no final de Novembro


A conclusão das obras da sede do centro está prevista para 30 de Novembro. Nessa altura, serão quase 1400 metros quadrados dedicados à criação de uma realidade que se projectará para fora de computadores, televisões, projectores e todo o tipo de gadgets que possam suportar imagens a três dimensões.

Entre outras valências, o complexo terá um laboratório motion capture, onde será possível, por exemplo, registar movimentos humanos para aplicar em jogos de computador. Haverá ainda vários laboratórios e um «show room», com 60 lugares, onde serão exibidas e testadas aplicações. Um espaço que poderá receber visitantes.

Quase Hollywood

Para já, a prioridade será o desenvolvimento de conteúdos, à semelhança dos que alimentam alguns dos ecrãs que Gastão Marques tinha atrás de si, durante a entrevista. Um deles permitia realizar vídeo-conferências com o interlocutor projectado fora do painel, outro possibilitava assistir a televisão a três dimensões e um terceiro parecia ter saído do filme «Relatório Minoritário», em que Tom Cruise, na pele de um polícia futurista, manuseava as imagens que emanavam de um painel de luz, numa série de gestos, quase demiúrgicos, através dos quais premeditava crimes antes deles acontecerem.

Em Portalegre ainda não se fazem previsões do futuro. Quanto à capacidade criadora, tem estado entregue a pouco mais de uma dezena de pessoas, mas o novo centro vai permitir a inclusão de mais. «Neste momento, a nível do ICT-VR, somos 12 pessoas a trabalhar, através da nossa rede de parceiros somos 20 a 25. Agora, quando o projecto arrancar em pleno vai-se alargar, penso que muito rapidamente, e para números expressivos», sublinhou Gastão Marques.

Hugo Beleza
PortugalDiário

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EDIÇÃO DE HOJE DO ALTO ALENTEJO


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E AGORA , JOSÉ ?



E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama protesta,
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,

seu terno de vidro, sua incoerência,
seu ódio - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse…
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, pra onde?


Carlos Drummond de Andrade

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terça-feira, 21 de outubro de 2008

« LOUVADO SEJAS, Ó MAGALHÃES ! »

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EDIÇÃO DE HOJE DO JORNAL FONTE NOVA


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ABERTURA

Eu abria o rádio
eu abria o aparelho
era uma flor branca que eu abria
de sopro
eu soprava e eu abria a flor
A flor tocava música com as várias mãos
das pétalas
A flor tocava uma simbolização dum tempo
caído podre de espera de cor branca
O tempo espera-se em pintar-se
de branco
para cegar uma cor
mas a minha flor abria-se de
pétalas
e as várias mãos escreviam um
piano por cima de teclas grãos vários
seguidos uns aos outros.
Era assim uma harmonia
entre flor
tempo a querer-se de cor branca em cegar
era assim umas teclas cantarem filhos de grãos
por dentro dos grãos mesmos
unidos que eram em dimensão de lado
era assim um cantar-me o tempo todo
não era assim um cantar-me o tempo todo
era assim um pairar-me
o tempo todo em Nijinsky
o tempo em um fazer-me ballet pelo quarto inteiro
quando eu tinha aberta a cabeça que imagino
da música
Abria a pétala favorita do harém
onde no centro um sultão da flor
no centro que era o amarelo da flor
abria a pétala favorita da flor
e então
e era então que me soava dentro da manhã
do quarto
uma música desfibrada de tempo serôdio
como se tudo me fosse em longe
como se a música levasse longe
o céu.


António Gancho
O Ar da Manhã

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segunda-feira, 20 de outubro de 2008

EM PORTALEGRE CIDADE DO ALTO ALENTEJO ( O MELHOR E O PIOR) 1

Estádio Municipal de Portalegre:


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EM PORTALEGRE CIDADE DO ALTO ALENTEJO ( O MELHOR E O PIOR)

Iniciamos hoje neste espaço uma nova rubrica sobre a nossa cidade, concelho e região.
Convidamos os nossos leitores a remeter-nos fotos do melhor e do pior da cidade, do concelho e da região.
As fotos podem ser enviadas para a nossa caixa de correio: portalegrecidadedoaltoalentejo@gmail.com.


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AMAR



Eu quero amar, amar perdidamente!

Amar só por amar: Aqui... além...

Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente…

Amar! Amar! E não amar ninguém!



Recordar? Esquecer? Indiferente!...

Prender ou desprender? É mal? É bem?

Quem disser que se pode amar alguém

Durante a vida inteira é porque mente!



Há uma Primavera em cada vida:

É preciso cantá-la assim florida,

Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!



E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada

Que seja a minha noite uma alvorada,

Que me saiba perder... pra me encontrar...


Florbela Espanca
Charneca em Flor

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sábado, 18 de outubro de 2008

ÁRVORE

Gostava de ter árvores como alguns têm flores.
Árvores, muitas árvores: laranjeiras, pinheiros, uma oliveira ao pé
do mar, se eu tivesse uma casa a sotavento das dunas
como as que se adivinham em certos quadros de Cézanne
se a luz é muito clara e permanece
com velhos nomes gregos que não sei.
Nespereiras, limoeiros, uma que outra ameixoeira
parecendo, vistas de longe, ser
de uma substância estranha e desconhecida.
Não me importava, até, de em tardes de calor
ter dentro do meu quarto um abrunheiro donde pendesse
um decente e fraternal cadáver.

A verdade é que não me assusto facilmente
e tenho confiança no reino vegetal.

Malus sieboldi, Catoneaster dielsiana, vós sois
os mais exactos filhos do mundo.

Gostaria de me rodear, um dia, de videiras
- essas árvores turvas da esperança -
e quando digo rodear sei o que digo, pois
queria que se enrolassem nos meus rins, nas espáduas
me descessem pelas pernas e lançassem
perto do meu sexo folhas novas
e que, ao lusco-fusco, enquanto no céu passam
os pequenos satélites mortais e luminosos que o desespero
do Homem lá coloca, por surpresa se transformassem
em plantas de gesso de frutos impensáveis.

Chego a perturbar-me por vezes se vejo
uma árvore junto a um hospital

Não sei porquê creio que me lembro mais
ou sinto mais
agudamente os níveis dolorosos das origens
do cristal, da carne
os esponjosos tecidos da sombra e da frescura
das cores da morte pronta para o grande tumulto.

Que medo, em certas noites, ver
de noite uma árvore

Sei perfeitamente que uma árvore é um símbolo
obscuro da nossa vida, principalmente da nossa vida
que não houve. Mas mesmo assim
dentro das ruas, dentro das casas
as árvores têm um outro entendimento
um mistério muito delas
- e não completamente inventados -
pois não desprezam a agonia dos homens, o choro dos homens
o seu riso, a sua fome, os sinais todos
que o Homem podia e devia ter.

As árvores começam e acabam sem amor
e sem ódio.

Nicolau Saião
Os objectos inquietantes

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