MONARQUIA/REPÚBLICA
V
(Lágrimas de raiva nos olhos. Ainda água.
Notícia da proclamação da Monarquia no
Porto. As pedras preparam-se para acor-
dar. Em 1918-1919 a República era uma
religião burguesa muito grave.)
A palavra República
tornou-se de repente tão real,
sonho com recorte
— envólucro de chamas,
corpo de mulher ritual
que todas as noites condenava o sol à guilhotina,
para sentirmos respirar melhor a morte.
Uma palavra
que tornava a liberdade mais misteriosa
para além da luz e das trevas.
República
— religião em que os deuses se evadiam dos templos
para se misturarem com os homens no suor das labaredas!
VI
(A bandeira monárquica içada no Mon-
santo em Janeiro de 1919. As pedras acor-
daram. O povo assalta os museus para
se munir das armas velhas que lhes res-
tam. Cantava-se «sobre a terra, sobre o mar».)
As mãos fugiram, dos braços!
e durante a noite
entraram no sonho exacto
de colarem com pincéis de lume
nas esquinas das ruas
os editais da cólera
a favor da morte com sentido
(a morte no passado é o que depois chamamos tempo):
ÀS ARMAS, CIDADÃOS!
Era nítido que todos queriam continuar a sonhar em comum,
e recusavam as superfícies com fronteiras.
ÀS ARMAS, CIDADÃOS! ÀS ARMAS!
Todos metem à pressa nos olhos os incêndios necessários
para acordar em asas
a liberdade presa ao vento do agitar das bandeiras.
(Lágrimas de raiva nos olhos. Ainda água.
Notícia da proclamação da Monarquia no
Porto. As pedras preparam-se para acor-
dar. Em 1918-1919 a República era uma
religião burguesa muito grave.)
A palavra República
tornou-se de repente tão real,
sonho com recorte
— envólucro de chamas,
corpo de mulher ritual
que todas as noites condenava o sol à guilhotina,
para sentirmos respirar melhor a morte.
Uma palavra
que tornava a liberdade mais misteriosa
para além da luz e das trevas.
República
— religião em que os deuses se evadiam dos templos
para se misturarem com os homens no suor das labaredas!
VI
(A bandeira monárquica içada no Mon-
santo em Janeiro de 1919. As pedras acor-
daram. O povo assalta os museus para
se munir das armas velhas que lhes res-
tam. Cantava-se «sobre a terra, sobre o mar».)
As mãos fugiram, dos braços!
e durante a noite
entraram no sonho exacto
de colarem com pincéis de lume
nas esquinas das ruas
os editais da cólera
a favor da morte com sentido
(a morte no passado é o que depois chamamos tempo):
ÀS ARMAS, CIDADÃOS!
Era nítido que todos queriam continuar a sonhar em comum,
e recusavam as superfícies com fronteiras.
ÀS ARMAS, CIDADÃOS! ÀS ARMAS!
Todos metem à pressa nos olhos os incêndios necessários
para acordar em asas
a liberdade presa ao vento do agitar das bandeiras.
José Gomes Ferreira
Memória - III
Etiquetas: José Gomes Ferreira, Poesia
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