VINDO ESTA DAMA HUMA VEZ A CASA DO POETA LHE PEDIO CEM MIL REIS PARA HUM DESEMPENHO.
Betica: a bom mato vens
com teu dá cá, com teu toma,
o diabo te enganou,
não pode ser outra cousa.
Viste-me acaso com jeito,
de comissário da frota,
que faz roupa de francês
dos borcados de Lisboa?
Sou eu acaso o Mazulo,
que, do que tem de outras contas,
dá sem conta cada um ano
cem mil cruzados à Rola?
Sou Mataxim por ventura,
que vim onte ontem d'Angola,
e dos escravos alheios
faço mercancia própria?
Menina, eu bato moeda?
eu sou um pobre idiota,
que para um tostão ganhar
estudo uma noite toda.
Cem mil-réis me vens pedir?
a mim, cem mil-réis, demônia?
se eu algum dia os vi juntos,
Deus mos dê, e mos comei.
Se eu nascera Genovês,
ou fora visrei de Goa,
vinte quatro de Sevilha,
ou quarenta e oito de Roma:
Dera-te, minha Betica,
pela graça, com que tomas,
mais ouro, que vinte minas,
mais sedas, que trinta frotas.
Mas um pobre estudantão,
que vive à pura tramóia,
e sendo leigo, se finge
cleriguíssimo corona:
Que pode, Betica, dar-te,
se não qués versos, nem prosa?
eu não dou senão conselhos,
se mos paga, quem mos toma.
Se me há de custar tão caro
erguer-te uma vez as roupas,
com outra antes de barrete,
do que castigo de gorra.
Para que sendo tão rica
pedes como pobretona,
se esses teus dentes de prata
estorvem o dar-te esmolas!
Que mais cabedal desejas,
se és tão rica de parolas,
que com vários chistes pedes
todo um dia a mesma cousa?
Tu pedindo, e eu negando,
que cousa mais preciosa,
que val mais, do que desejas,
e a ti nada te consola.
Cem mil-réis de uma só vez?
pois, pobreta, à outra porta;
Deus te favoreça Irmã,
não há trocado; perdoa.
Não há real em palácio,
ando baldo, perdi a bolsa;
que são os modos, com que
se despede uma pidona
Gregório de Matos
Obra Poética
com teu dá cá, com teu toma,
o diabo te enganou,
não pode ser outra cousa.
Viste-me acaso com jeito,
de comissário da frota,
que faz roupa de francês
dos borcados de Lisboa?
Sou eu acaso o Mazulo,
que, do que tem de outras contas,
dá sem conta cada um ano
cem mil cruzados à Rola?
Sou Mataxim por ventura,
que vim onte ontem d'Angola,
e dos escravos alheios
faço mercancia própria?
Menina, eu bato moeda?
eu sou um pobre idiota,
que para um tostão ganhar
estudo uma noite toda.
Cem mil-réis me vens pedir?
a mim, cem mil-réis, demônia?
se eu algum dia os vi juntos,
Deus mos dê, e mos comei.
Se eu nascera Genovês,
ou fora visrei de Goa,
vinte quatro de Sevilha,
ou quarenta e oito de Roma:
Dera-te, minha Betica,
pela graça, com que tomas,
mais ouro, que vinte minas,
mais sedas, que trinta frotas.
Mas um pobre estudantão,
que vive à pura tramóia,
e sendo leigo, se finge
cleriguíssimo corona:
Que pode, Betica, dar-te,
se não qués versos, nem prosa?
eu não dou senão conselhos,
se mos paga, quem mos toma.
Se me há de custar tão caro
erguer-te uma vez as roupas,
com outra antes de barrete,
do que castigo de gorra.
Para que sendo tão rica
pedes como pobretona,
se esses teus dentes de prata
estorvem o dar-te esmolas!
Que mais cabedal desejas,
se és tão rica de parolas,
que com vários chistes pedes
todo um dia a mesma cousa?
Tu pedindo, e eu negando,
que cousa mais preciosa,
que val mais, do que desejas,
e a ti nada te consola.
Cem mil-réis de uma só vez?
pois, pobreta, à outra porta;
Deus te favoreça Irmã,
não há trocado; perdoa.
Não há real em palácio,
ando baldo, perdi a bolsa;
que são os modos, com que
se despede uma pidona
Gregório de Matos
Obra Poética
Etiquetas: Gregório de Matos, Poesia
1 Comentários:
Cá para mim este poema assenta como uma luva na Luísa.
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