terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

EDIÇÃO DE AMANHÃ DO ALTO ALENTEJO


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CAIXADÓCLOS

- Patriazinha iletrada, que sabes tu de mim?
- Que és o esticalarica que se vê.

- Público em geral, acaso o meu nome...
- Vai mas é vender banha da cobra!

- Lisboa, meu berço, tu que me conheces...
- Este é dos que fala sozinho na rua...

- Campdòrique, então, não dizes nada?
- Ai tão silvatávares que ele vem hoje!

- Rua do Jasmim, anda, diz que sim!
- É o do terceiro, nunca tem dinheiro...

- Ó Gaspar Simões, conte-lhes Você...
- Dos dois ou três nomes que o surrealismo...

- Ah, agora sim, fazem-me justiça!

- Olha o caixadóclos todo satisfeito
a ler as notícias...


Alexandre O'Neill
Feira Cabisbaixa

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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

FERNANDO NOBRE DISPONÍVEL

PORTUGAL

Avivo no teu rosto o rosto que me deste,
E torno mais real o rosto que te dou.
Mostro aos olhos que não te desfigura
Quem te desfigurou.
Criatura da tua criatura,
Serás sempre o que sou.

E eu sou a liberdade dum perfil
Desenhado no mar.
Ondulo e permaneço.
Cavo, remo, imagino,
E descubro na bruma o meu destino
Que de antemão conheço:

Teimoso aventureiro da ilusão,
Surdo às razões do tempo e da fortuna,
Achar sem nunca achar o que procuro,
Exilado
Na gávea do futuro,
Mais alta ainda do que no passado.

Miguel Torga
Diário X

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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

EDIÇÃO DE ONTEM DO ALTO ALENTEJO


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DESAFOGO

Onde estás, oh Filósofo indefesso
Pio sequaz da rígida Virtude,
Tão terna a alheios, quanto a si severa?
Com que mágoa, com que ira olharas hoje
Desprezada dos homens, e esquecida
Aquela ânsia, que em nós pousou Natura
No âmago do peito, — de acudir-nos
Co'as forças, c'o talento, co'as riquezas
À pena, ao desamparo do homem justo!
Que (baldão da fortuna iníqua) os Deuses
Puseram para símbolo do esforço,
Lutando a braços c'o áspero infortúnio?
Pedra de toque em que luzisse o ouro
De sua alma viril, onde encravassem
Seus farpões mais agudos as Desgraças,
E os peitos de virtude generosa
Desferissem poderes de árduo auxílio?
Que nunca os homens são mais sobre-humanos
Mais comparados c'os sublimes Numes,
Que quando acodem com socorro activo,
Não manchado de sórdido interesse,
Nem do fumo de frívola ufania;
Ou cheios de valor e de constância
Arrostam co'a medonha catadura
Da Desgraça, que apura iradas mágoas
Na casa nua do varão honesto.
Mas Grécia e Roma há muito que acabaram;
E as cinzas dos Heróis fortes e humanos,
Que as cívicas coroas preferiam
Ao louro triunfal, tinto de sangue,
Hoje as pisa, hoje espalha desdenhoso
O vulgo cego dos Filautes duros,
Surdo à voz que o repreende vingadora.
Que os homens, de imprudentes, não alcançam,
Que o perene prazer único e puro,
Que o Céu outorga neste esquivo exílio,
E o que se esparge pelos seios da alma,
E que a transpassa de imortal deleite,
Quando partimos, com bizarra dextra,
Os bens, que liberal nos deu a sorte,
E vemos transluzir radiosa e viva
A Alegria no rosto do afligido,
A Dissabor molesto condenado.

Filinto Elísio
Miscelânia

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quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

O POLVO...

LIBERDADE DE IMPRENSA EM PORTUGAL 2010

OS LOUCOS

Há vários tipos de louco.

O hitleriano, que barafusta.
O solícito, que dirige o trânsito.
O maníaco fala-só.

O idiota que se baba,
explicado pelo psiquiatra gago.
O legatário de outros,
o que nos governa.

O depressivo que salva
o mundo. Aqueles que o destroem.

E há sempre um
(o mais intratável) que não desiste
e escreve versos.

Não gosto destes loucos.
(Torturados pela escuridão, pela morte?)
Gosto desta velha senhora
que ri, manso, pela rua, de felicidade.

António Osório
A Ignorância da Morte

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terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

REPÚBLICA VISTA ATRAVÉS DE POSTAIS

REPÚBLICA

Iniciaram-se as comemorações do centenário da implantação da República. Apesar de os tempos impregnados de dificuldades, da lentidão da justiça, da voracidade do Estado, do constante atropelo às leis por quem não o devia fazer, da corrupção de bastardos a deixarem na rua da amargura a honradez, dos desvario das contas públicas, dos pedradores financeiros, dos agiotas sem escrúpulos, da insegurança existente nos centros mais populosos, apesar de todos estes malefícios, vale a pena vitoriarmos a República, sem simulações ou fingimentos, desprovidos de desnecessária fanfarronice.

Os republicanos têm o direito de se afirmarem como tal, o mesmo direito é concedido aos monárquicos, pois a República defende as virtudes da liberdade, da igualdade e da fraternidade. Mesmo quando isso não aconteceu no passado, mesmo quando um ou outro fanático assim não o entende agora. Os adversários da República acusam-na de grande número de maldades no presente, avivando-nos a memória ao evocarem actos vis cometidos durante o primeiro período de governação. São verdadeiros e nenhum republicano no seu bom juízo se envaidece por isso.

No entanto, os de dedo em riste contra a República, nunca, nem ao de leve, afloram as razões porque um punhado de republicanos derrubou um regime com oito séculos de existência, num país prenho de analfabetismo, submissão e estrangulamento económico da maioria da população, a qual em última instância emigrava. Nunca referem a forma como os possidentes exploravam o zé-povinho, muito menos concedem atenção às lutas intestinas existentes nos últimos reinados, onde no dizer de João Chagas tudo foi falsificado. “Uma só coisa era real – a ruína”, remata o jornalista.

Passados cem anos vivemos melhor, muito melhor, incomensuravelmente melhor. Vejam-se os indicadores relativos à educação, saúde e assistência social, habitação, consumo de bens essenciais, entretenimento e esperança de vida. Os monárquicos ortodoxos dirão: olha a grande coisa! Estão há cem anos no poder! Descontados os quarenta e oito anos de castração salazarista.

Os republicanos erraram muito e vão continuar a errar, mas no essencial, o povo que durante centenas de anos sustentou, suportou e aturou as outras duas classes tem ao seu alcance a possibilidade de alterar, demitir ou substituir os governos.

Através do voto livre e sem chapeladas tão ao gosto e uso durante o ludíbrio de progressistas e regeneradores. Lembrem-se!

A.F.

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REVOLUÇÃO

Como casa limpa
Como chão varrido
Como porta aberta

Como puro início
Como tempo novo
Sem mancha nem vício

Como a voz do mar
Interior de um povo

Como página em branco
Onde o poema emerge

Como arquitectura
Do homem que ergue
Sua habitação

Sophia de Mello Breyner Andresen
O Nome das Coisas

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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

EDIÇÃO DE HOJE DO ALTO ALENTEJO


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EDIÇÃO DE ONTEM DO JORNAL FONTE NOVA


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PORTUGAL

Maior do que nós, simples mortais, este gigante
foi da glória dum povo o semideus radiante.
Cavaleiro e pastor, lavrador e soldado,
seu torrão dilatou, inóspito montado,
numa pátria... E que pátria! A mais formosa e linda
que ondas do mar e luz do luar viram ainda!
Campos claros de milho moço e trigo loiro;
hortas a rir; vergéis noivando em frutos de oiro;
trilos de rouxinóis; revoadas de andorinhas;
nos vinhedos, pombais: nos montes, ermidinhas;
gados nédios; colinas brancas olorosas;
cheiro de sol, cheiro de mel, cheiro de rosas;
selvas fundas, nevados píncaros, outeiros
de olivais; por nogais, frautas de pegureiros;
rios, noras gemendo, azenhas nas levadas;
eiras de sonho, grutas de génios e de fadas:
riso, abundância, amor, concórdia, Juventude:
e entre a harmonia virgiliana um povo rude,
um povo montanhês e heróico à beira-mar,
sob a graça de Deus a cantar e a lavrar!
Pátria feita lavrando e batalhando: aldeias
conchegadinhas sempre ao torreão de ameias.
Cada vila um castelo. As cidades defesas
por muralhas, bastiões, barbacãs, fortalezas;
e, a dar fé, a dar vigor, a dar o alento,
grimpas de catedrais, zimbórios de convento,
campanários de igreja humilde, erguendo à luz,
num abraço infinito, os dois braços da cruz!
E ele, o herói imortal duma empresa tamanha,
em seu tuguriozinho alegre na montanha
simples vivia – paz grandiosa, augusta e mansa! -,
sob o burel o arnês, junto do arado a lança.
Ao pálido esplendor do ocaso na arribana,
di-lo-íeis, sentado à porta da choupana,
ermitão misterioso, extático vidente,
olhos no mar, a olhar sonambolicamente...
«Águas sem fim! Ondas sem fim! Que mundos novos
de estranhas plantas e animais, de estranhos povos,
ilhas verdes além... para além dessa bruma,
diademadas de aurora, embaladas de espuma!
Oh, quem fora, através de ventos e procelas,
numa barca ligeira, ao vento abrindo as velas,
a demandar as ilhas de oiro fulgurantes,
onde sonham anões, onde vivem gigantes,
onde há topázios e esmeraldas a granel,
noites de Olimpo e beijos de âmbar e de mel!»
E cismava, e cismava... As nuvens eram frotas,
navegando em silêncio a paragens ignotas...
– «Ir com elas...Fugir...Fugir!...» Ûa manhã,
louco, machado em punho, a golpes de titã,
abateu, impiedoso, o roble familiar,
há mil anos guardando o colmo do seu lar.
Fez do tronco num dia uma barca veleira,
um anjo à proa, a cruz de Cristo na bandeira...
Manhã de heróis... levantou ferro... e, visionário,
sobre as águas de Deus foi cumprir seu fadário.
Multidões acudindo ululavam de espanto.
Velhos de barbas centenárias, rosto em pranto,
braços hirtos de dor, chamavam-no... Jamais!
Não voltaria mais! Oh! Jamais! Nunca mais!
E a barquinha, galgando a vastidão imensa,
ia como encantada e levada suspensa
para a quimera astral, a músicas de Orfeus:
o seu rumo era a luz; seu piloto era Deus!
Anos depois, volvia à mesma praia enfim
uma galera de oiro e ébano e marfim,
atulhando, a estoirar, o profundo porão
diamantes de Golconda e rubins de Ceilão!

Guerra Junqueiro
Pátria

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